quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

O Cérebro que conta histórias



A cerca de 20 anos o Neurologista e Psiquiatra Americano V.S. Ramachadran resolveu iniciar uma pesquisa impressionante que foi publicada em formato de livro “The Tell-Tail Brain, Quest for What Makes us Human” (O cérebro que conta histórias, a busca pelo que nos torna humanos). Será que as histórias contadas em nossas vidas influenciam completamente o que vivemos e o que presenciamos?  Em sua pesquisa, ele não só analisou os aspectos de sentimentos e memória de seus pacientes como também foi buscar contos e histórias antigas que poderiam estar relacionadas com as alucinações e distorções da realidade.

O que ele observou é que a grande maioria das alucinações compartilham de alguns aspectos semelhantes.
O que isso significa? Basicamente, as alucinações possuem uma origem. Parte de nossos sonhos e visões são construídos por restituições de memórias que nem sabemos que temos. De fato, se em algum momento quando crianças vimos uma imagem ou escutamos uma história podemos alucinar com estes aspectos em um futuro, só é necessário acionarmos os circuitos cerebrais. Como a memória fica espalhada pelo cérebro, ao contrário do que se acredita popularmente, é relativamente fácil ativarmos circuitos acidentalmente. Parte de sua pesquisa, esteve focada em comparar alucinações, e descrições de imagens em locais completamente distantes em nosso planeta. Curiosamente, pessoas no continente americano alucinam coisas completamente diferentes de pessoas no continente asiático. Mas por que isso? A resposta está nas histórias contadas de gerações para gerações, as imagens apresentadas nas televisões, filmes e muitas outras coisas. Um dos contos que mais me impressionou foi o de um homem, de 39 anos que foi espancado na cidade de Kracóvia, depois de acordar do coma ele contava que encontrou parentes discutindo seu nascimento em uma fonte que dava a harmonia para todos os mundos. Nesta fonte ele descreveu inúmeros animais que estavam rondando seus pais. Para qualquer leigo, a pessoa pode pensar que ele saiu de seu corpo e teve algum contato divino, mas o fato é que o que ele descreveu já havia sido descrito em um conto nórdico “Os nove mundos” que é história para crianças em livros infantis.  Por mais que o homem tenha falhado em descrever corretamente o conto inteiro, trocando nomes e outras coisas, o conto original era bibliografia de seus pais e ele não sabia.

Outro aspecto importante a ser levantado é que ao se contar uma história, mais real ela se torna. Quando se busca uma memória e a encontra, muitas vezes ela está incompleta. O nosso cérebro trabalha, então, para reconstituí-la, e os pontos falhos são preenchidos com aspectos vividos e experiências. Por tanto, quanto mais se descreve um objeto ou acontecimento, mais se cria em torno dele, o tornando “real”. Pessoas que possuem membros amputados, “sentem” coceira, dor em um dedo ou pé que nem são mais parte de seus corpos. Esta síndrome é conhecida como a dos “membros fantasmas” e pode ser facilmente curada, treinando o cérebro com um espelho, ao se tentar mandar e receber informações para um membro amputado e deixar claro para seu sistema visual que tal membro não está mais presente. Os membros fantasmas são ótimos exemplos de que não sentimos necessariamente o que existe.

Para chegarmos a conclusões lógicas em relação as alucinações, devemos comparar contos orientais e ocidentais em diferentes períodos. Curiosamente, algumas aldeias orientais não possuíam contos espirituais até a formação do reino cristão europeu precedente à idade média. O posterior contato abundante entre as civilizações e o intercâmbio cultural, culminou, eventualmente em contos semelhantes para ambos os lados. Observa-se então o início de algumas histórias que jamais haviam sido descritas antes no oriente. É importante notar que os orientais documentavam historias até mesmo antes do egípcios.

Mas não precisamos ir tão longe. Ainda hoje, alguns pacientes descrevem, ao acordar do coma, que nadaram em uma piscina e que muitos “plugs” estavam presentes em seus corpos, maquinas gigantes haviam tomado o mundo. A referência é clássica, mas nunca existente a cerca de 15 anos atrás. Ele conta muitos casos em seus livros. Alguns deles relacionados a segunda guerra mundial, pilotos de avião, contos da idade média e daí por diante.

Se a alma existe ou não, não podemos afirmar, uma vez que é impossível de ser testada. Mas é fato que ao falarmos a respeito da existência de alma estamos implantando sementes em nosso cérebro que irão gerar alucinações em algum momento. Todos os experimentos feitos até hoje em busca de alma, inclusive os testes conhecidos e brincadeiras espirituais já foram desmistificadas como influencias de campos magnéticos ou alucinações descritas por Spinoza. O fato mais importante a ser levantado é a capacidade de nosso cérebro de construir pseudo-realidades, que por mais reais que sejam, nada mais são do que uma descrição “distorcida e praticamente real” para cada indivíduo do que realmente existe ou acontece. 

Fonte:

V.S Ramachadran,The tell-Tail Brain: A Neuroscientist’s Quest for What Makes Us Human, W. W. Norton & Company. ISBN-13: 978-0393340624

Mark D Bear PhD, Barry W Connors PhD, Minhael A Paradiso PhD, Neuroscience 3rd Edition. ISBN/ISSN: 9780781760034

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#RI

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