sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Respeito mútuo - Ateus e Religiosos: Rir de uma ideia é falta de respeito pelo defensor dessa ideia?


Uma coisa é o respeito aos indivíduos e aos seus direitos instituídos, em uma sociedade. Outra, completamente diferente, é o respeito a uma ideia e aos seus símbolos.
O respeito ao indivíduo inclui, entre outros cuidados, não discriminá-lo ou privá-lo de seus direitos civis, políticos e sociais em consequência de suas características físicas e sociais, ou de suas concepções religiosas, filosóficas ou políticas.
Seja qual for a ideia religiosa, filosófica ou política de um ser humano ou de um grupo de seres humanos, esta ideia não priva do direito ao respeito.
O respeito aos indivíduos não abrange respeitar as suas ideias, pois, se assim fosse, o diálogo social se veria paralisado, estagnado na concepção de que uma ideia precisa ser respeitada de per si.
O direito, neste caso, restringe-se ao direito dos indivíduos de desenvolverem estas ideias e agirem, dentro da lei, de acordo com elas.
Quando um religioso exige respeito à uma ideia (sua crença) e aos seus símbolos, está mais do que extrapolando o conceito de direito; está, antes que tudo, desrespeitando o direito de outros de não compartilharem desta ideia e de possuírem outras opostas ou divergentes.
Pois, comparativamente, se um comunista exigir respeito ao Comunismo e aos seus símbolos, estará desrespeitando o direito dos capitalistas às suas próprias ideias sobre sistemas econômicos.
Assim também, quando um religioso muçulmano exige o respeito para os seus símbolos sagrados a um cristão ou a um umbandista está, automaticamente, desrespeitando o direito dos cristãos (ou umbandistas) de defenderem suas próprias ideias do que é sagrado ou não.
Pois, como respeitar o sagrado alheio quando não se tem a mesma concepção do que é sagrado?
Se, para uns, o sagrado é uma pedra de cor escura incrustada em uma construção eternamente coberta, para outros o sagrado pode ser uma imagem de um ser humano ensanguentado preso em um instrumento de tortura e morte.
Um indivíduo adepto de qualquer das duas concepções não deve nem pode ser obrigado a considerar sagrado o que o outro considera assim.
Caso todos os religiosos exijam respeito às suas crenças e aos seus símbolos, depreende-se que todos eles estarão invadindo e coibindo o direito de crença religiosa do outro.
Um terceiro indivíduo que não considere nenhum dos dois objetos citados como sagrado não estará desrespeitando o direito dos religiosos, mas estará na mesma posição que cada um dos dois ocupa em relação ao outro: o de negação do sagrado alheio.
Quando a concepção de respeito ao indivíduo e ao direito de crença é estendida ao respeito para a crença em si, torna-se fácil perceber que todos os religiosos "desrespeitam" as crenças alheias, ao negarem seus status de sagrado.
É fato social corriqueiro que, no Brasil e no mundo, religiosos de várias vertentes exigem respeito às suas crenças e seus símbolos sagrados, como a imagem de um rosto de um alegado profeta ou filho unigênito de um deus.
Ao rasgar a bandeira com a foice e o martelo, ninguém está desrespeitando um comunista e nada ocorrerá em âmbito jurídico, a quem isso fizer, em um país livre.
Rasgar a pintura de um rosto considerado sagrado para muçulmanos ou para cristãos também não faz com que isso se configure desrespeito a um indivíduo de uma dessas crenças.
Quando um religioso se considera ofendido por uma piada com seus símbolos sagrados, não está realmente se sentindo ofendido, está indignado por sua fé não ser encarada pelas outras pessoas com a mesma seriedade com que ele a encara.
Se passa a exigir que seu sentimento de indignação seja respeitado através do respeito aos seus símbolos sagrados, está na verdade impedindo o outro de se expressar livremente.
Está sendo autoritário.
Além disso, hipócrita, uma vez que ele próprio, o religioso, não respeita a ideia alheia do sagrado, pois nem um muçulmano considera a imagem de Jesus sagrada, nem um cristão considera a imagem de Maomé assim.
Ateus, ocasionalmente, demonstram que não respeitam o sagrado muçulmano ou o sagrado cristão ou qualquer concepção de sagrado.
E é por isso que vemos tantos cristãos exigirem que um ateu não faça piadas com Jesus Cristo ou com Deus Pai: Se não acredita em Deus, respeite. Leia-se: Se não acredita nele, aja como se acreditasse, finja que considera sagrado e não ria dele.
Ou seja, não só um ateu tem direito a rir do sagrado alheio, como também isso não significa que não respeita o direito dos indivíduos de crerem no que quiserem.
Se um religioso rir da ideia do ateísmo, não estará desrespeitando os ateus; mas estará, se exigir-nos que não riamos de seu deus.
Quando um ateu exige respeito, está se referindo ao respeito pelo seu direito de ser ateu, sem que isso lhe acarrete nenhuma perda de direitos civis, sociais e políticos.
Os ateus não exigem respeito algum ao ateísmo. É apenas uma ideia.
O respeito que indivíduos ateus exigem não é o respeito a esta ideia nem aos seus símbolos, mas apenas e tão somente o respeito aos ateus e aos seus direitos, que são os mesmos direitos dos religiosos.
Um religioso tem todo o direito de negar o sagrado alheio, assim como um ateu tem todo direito de negar todos os sagrados.
Os religiosos podem rir de qualquer símbolo de ateísmo, assim como os ateus podem rir de qualquer símbolo religioso, mas com todo o respeito pelo direito do outro.

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