sábado, 30 de novembro de 2013

Entrevista d'ARCA - Advogado das vítimas de pedofilia que conseguiu a condenação solidária de padre e da diocese de Umuarama concede entrevista exclusiva a ARCA

 Advogado do menor vítima de pedofilia diz que não cabe recurso da decisão do STJ que condenou a diocese de Umuarama com responsabilidade solidária.
     imagem: Umuarama ilustrado e texto: Michelle Goularte

Na manhã de sexta feira, o Dr. Geraldo Alberti , advogado dos menores vítimas de pedofilia , no caso envolvendo o Padre José Cipriano da Silva, ocorrido em 2002 na cidade de São Tomé no Paraná, concedeu uma entrevista a ARCA, onde o mesmo afirmou que não há possibilidade de dar provimento ao recurso interpelado Igreja Católica, ao STF, além de prestar outras explicações quanto as alegações da Diocese contra a decisão do STJ. Saiba mais sobre o caso nesta matéria.

ENTREVISTA:

Arca: Dr. Geraldo, o senhor deu declaração a um jornal da cidade Umuarama, dizendo que não cabe recurso da decisão do STJ ao STF. Poderia explicar melhor porque não cabe recurso?

Advogado: Quando o Tribunal de Justiça do Paraná julgou a ação procedente aos meninos, vítimas de pedofilia, a Mitra Diocese de Umuarama, que é a responsável pela paróquia de São Tomé, manuseou o recurso especial e dentro dele, o recurso extraordinário ao STF, onde ambos sobem juntos ao STJ.
O STJ admitiu o recurso especial, porém, o recurso extraordinário ao STF foi negado seguimento. A Igreja Católica deixou de exercer o direito de interposição de agravo, que transitou em julgado em 29 de maio de 2013, portanto, decorreu o prazo legal que permitia a diocese interpor o agravo de instrumento para tentar subir o recurso ao STF. Então ficou pendente de julgamento o recurso especial, que foi julgado dia 29 de novembro, onde os ministros foram unanimes na decisão em condenar de forma solidária, tanto o padre quanto a igreja.
O STJ entendeu que o padre cumpre ordens da igreja, que gera a responsabilidade civil para a mitra, diocese, porque o padre não pode dizer o que ele quer, não pode fazer o que ele quer, então, o fato de cumprir ordens da igreja, gera por si só a responsabilidade civil.

Arca: O fato de o padre ter cometido o crime dentro da casa paroquial, que é inclusive mantida pelos fiéis, que leva um nome como se fosse uma extensão da igreja e é local de moradia de um de seus representantes, também configura o vínculo?

Advogado: Veja bem, essas pessoas são humildes, famílias humildes da periferia de São Tomé, trabalhadores braçais. Quanto às crianças, a confiança que a mãe tinha no religioso, como é público e notório, não desmerecendo a Igreja Católica que é uma instituição séria, não é um caso isolado, isso acontece. Então as mães confiam no religioso, mandam suas crianças para a catequese, e essas crianças fizeram amizade com este padre, parte das suas vidas foi lá junto com o padre, que ganhou a confiança delas, inclusive da mãe. As crianças disseram a mãe sobre os abusos que aconteceram várias vezes. O padre é réu confesso no processo crime.
Quando a mãe tomou conhecimento, denunciou ao conselho tutelar lá em São Tomé, onde foi parar no Ministério Público de Cianorte. Instaurou-se um processo crime, ouviram-se os menores e testemunhas e o religioso foi denunciado.

Arca: Quanto a alegação da Igreja de que não se poderia sentenciar civilmente, enquanto não houvesse sentença criminal, é procedente?

Advogado: Na sentença criminal o juiz já estipula um valor, desnecessário para entrar com um processo indenizatório. Neste caso, a Igreja não participou do processo crime, por isso foi feita uma ação apartada. E outra,são menores, julgou-se um, os outros dois estão em grau de recurso.

Arca: É provável que essa decisão seja igual nos outros dois processos?

Advogado: Creio que o caminho seja o mesmo, pois abriu-se precedente no STJ.

Arca: Essa decisão é de suma importância, um marco no direito brasileiro, pois é a primeira vez que a Igreja é responsabilizada solidariamente, correto?

Advogado: Perfeitamente. Vários casos de pedofilia, você pode ver em vários lugares, mas sempre se processa só o religioso pelo crime. Essas famílias muitas vezes não ingressam com uma ação indenizatória. Essa ação também é a primeira a ser julgada no Brasil, não existe outra. É o primeiro precedente que se abriu. Eu creio que agora se moralizar, vai coibir, a igreja vai fiscalizar melhor o religioso. Eu sei que é muito difícil fiscalizar, mas vão tomar mais cuidados agora.

Arca: Uma das alegações dada pelo Bispo é que a igreja sempre afasta os padres de imediato quando toma conhecimento desse tipo de caso, instaura-se um processo administrativo baseado no Direito Canônico e caso confirmado o padre perde o direito de exercer o sacerdócio. Porém, temos outra situação aqui em Cruzeiro do Oeste, cidade vizinha a Umuarama e também pertencente à diocese de Umuarama, onde a igreja acabou transferindo o pedófilo, quando na verdade deveria afastá-lo. O senhor também está cuidando deste caso?

Advogado: Esse fato é de 2010, o menino inclusive é deficiente mental. Esse processo me marca profundamente, o menino só consegue conversar através da psicóloga, o pai é muito revoltado. No dia que ele tomou conhecimento dessa notícia, ligou para mim chorando. Como não havia nenhuma ação desse tipo, ele achava que para o filho dele não haveria justiça, depois dessa ação, está esperançoso. O processo ainda está tramitando em segredo de justiça.

Arca: E quanto à alegação da Igreja a respeito do Pacto da Santa Sé, utilizando-se do artigo 16, inciso I, que afasta o vínculo entre o padre e a igreja?

Advogado: O judiciário julga o que está na lei brasileira. Este tipo de alegação é um direito que eles têm para tentar se defender. Porém, a igreja responde, através da responsabilidade civil porque o padre é um mandatário, obedece a ordens. Neste caso, recai como uma empresa particular, o empresário responde pelos atos do empregado no exercício da função. Funciona da mesma forma com a igreja, o tratado não pode mudar a lei da responsabilidade civil.
É um caso secundário, não tem importância nenhuma para o direito brasileiro. É uma forma de organização interna deles.

Durante o processo, alegaram muitas coisas que se referiam ao direito canônico, mas a decisão foi aplicada de acordo com a responsabilidade civil solidária.

Arca: No dia da coletiva, o Bispo alegou que a igreja não pode ter controle do que os padres fazem dentro de suas casas e nem ser responsabilizada pelo o que eles fazem em seu horário de descanso. Este tipo de alegação é válida?

Advogado: Na visão dele é isso, mas juridicamente não é bem assim. O padre é padre 24 horas, não 12 horas, por conta dos votos que faz. Eu já disse, respeito à igreja, mas existe o joio no meio do trigo, uma pessoa dessa mancha a imagem da igreja. Acho que têm que modificar a lei da igreja, dar melhor suporte para os padres, eles tem que fiscalizar. O bispo responde por uma área e a função dele é cuidar, saber do que está precisando, o que está fazendo. Este caso aconteceu dentro da casa paroquial, dentro das dependências da igreja.

Arca: Segundo relatos, a igreja tomou conhecimento do fato 3 meses antes da policia. Na coletiva o Bispo foi questionado sobre ter afastado o padre, porém, não fizeram uma denuncia formal a policia. O Bispo respondeu que isso não era de competência da igreja e sim dos responsáveis pelos menores. Existe essa responsabilidade ou não?

Advogado: Neste momento entra a negligencia, a imprudência e a imperícia dentro da responsabilidade civil, porque como em 2002 os meninos eram crianças, indefesas. Qual era o papel da igreja? Era ir de encontro com o problema e tentar resolver, não virar as costas. Essas pessoas pobres são gente também! Eles merecem atenção. A constituição dá o direito a eles de buscar a justiça e obrigação de serem cuidados. A igreja não tem interesse em ir atrás e saber o que está acontecendo, as crianças são muito pobres, nunca ninguém foi procura-los para dar um consolo a eles. Caberia a igreja ajudar, reparar o problema.
Se isso tivesse acontecido, não precisaria de ação indenizatória, eles não estão interessados no dinheiro, eles queriam justiça.

Eu sei que agora o coraçãozinho deles está feliz, não por causa da indenização, mas porque foi feito justiça. São pessoas excluídas da sociedade, quase não tem acesso à justiça, agora eles viram que existe a justiça no Brasil.

O valor monetário para eles, embora sejam pobres, não é tão importante, apenas vai servir para preencher todo esse vazio desse tempo remoendo essa situação. Agora é só aguardar o cumprimento da sentença.

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