domingo, 27 de outubro de 2013

Simplicidade


Se formos procurar, tanto na internet quanto em bibliotecas em geral, a respeito do que religiões têm feito pela sociedade, na nossa história e seus efeitos – bons ou ruins – a conclusão que podemos facilmente chegar é que a mesma possui uma infinidade de argumentações e contra-argumentações que sempre revelam a epistêmica elaboração teológica, o comprometimento racional e lógico de seus detratores para fins de questionamentos que vários dogmas não permitem. Sendo assim, acabamos por direcionar nossos conceitos em torno destes estudos, destas concepções e até mesmo de algumas aliterações poéticas, outras prosaicas, mas de forma a repassar um conteúdo complexo e com o máximo de sensatez que nosso senso pode julgar, ou que, ao menos, consideremos nos representar.
Mas todos são assim (e quando se cita todos, cita-se a totalidade das pessoas neste planeta)? Não, não somos, e nem temos o porquê ser e fazer. A complexidade da sociedade humana passa em despercebido às generalizações, e suas causas são menos dispendiosas que as que usamos normalmente.
Citar um resultado e direciona-lo a uma totalidade, através de uma pesquisa que englobe um tema que atinja muitas pessoas, mas esta sendo realizada por uma população extremamente específica, e com varias e evidentes diferenças entre povos, não pode suscitar a uma realidade abrangente.
Certa vez, uma pesquisa realizada para se constatar o quanto os alunos de escolas pública do ensino médio no Brasil saberiam sobre a compreensão da teoria molecular foi-nos passada, onde a mesma seria analisada. Mas o que mais me chamou a atenção não foram os resultados, mas como foram obtidos. A mesma foi realizada em duas escolas publicas de Belo Horizonte, no ano de 2007, em seis salas de aulas. Mas de que maneira existira uma correlação séria entre a totalidade dos alunos medianos brasileiros e apenas os belo-horizontinos? Não, não há a menor chance de a correlação ser de fato válida, pois mesmo que os dados desta pesquisa corroborassem os números levantados pelo Ministério da Educação, ele apenas diria isso: que os dados do levantamento feitos em Belo Horizonte indicam uma paridade com os dados nacionais. E seria falacioso afirmar que, a partir desta, todos os dados daquela cidade sirvam sempre para analisar o país todo.
Estes erros, em menor consequência, ocorrem com frequência em levantamentos de varias reportagens vinculados a estes dados, inclui-se ai grandes meios de comunicação, blogs, editais e, em escala assustadoramente constante, nas redes sociais. Alegações que, por exemplo, pessoas disseram se sentirem melhores por sua fé, não podem ser extrapoladas para além do fato de que estas pessoas possuem sua individualidade ligada a uma cultura específica, a uma educação e convivência específicas. O mesmo se daria ao afirmar a descrença. E a quantidade de pessoas que aderem à este ou àquele posicionamento não é uma relação específica às informações sociais que temos do local que estas vivem. Não há na maioria das vezes uma relação causal analisada de maneira suficiente às conclusões que vemos muitos tomarem.
Sendo assim, nos perdemos na maior parte dos argumentos que envolvam pessoas e seus comportamentos. E um fator muito importante a se evidenciar nisto são as pessoas simples. O Brasil tem 33 milhões de analfabetos funcionais (cerca de 18% da população), ou seja, pessoas com menos de quatro anos de estudo, e 16 milhões de pessoas com mais de 15 anos que ainda não foram alfabetizadas. Os dados são do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).[1] Como poderíamos imaginar estas pessoas inseridas em determinados contextos que envolvam, por exemplo – e este é o foco deste texto – sua intermitente responsabilidade em compreender o que a religiosidade faz a elas?
A fé, que para elas é monopólio religioso, persiste não apenas como uma necessidade[2] a sua existência, mas uma naturalidade de seu dia a dia. E seus atos vão corresponder à esta naturalidade. Há uma dificuldade insípida das religiões organizadas em se retirar as crendices do comportamento de seus fiéis. Mesmo a rigidez do comprometimento exigido por algumas igrejas não impede, por mais fiel que o indivíduo se mostre, de que este se valha de suas superstições em suas e ações, e isso quando não os associa diretamente à sua religiosidade. Conheço senhoras que, mesmo pentecostais (e estas “lutam” contra isto, pois há o medo do desvio intermitente que houve com a Igreja Católica), não abandonaram costumes regionais como ‘não passar objetos para dentro de casa pela janela’, ou os sincretizaram, substituindo as ferraduras, galhos de arruda e patuás por envelopes (para dízimo) distribuídos nos cultos.
Para qualquer igreja, prelazias que impeçam estas ações são viperinas, onde as mesmas concorreriam com a desfaçatez da funcionalidade destas (para o religioso simplório, em geral, é possível que se uma coisa funcione, a outra também a faça) e isso não angariaria fiéis e, por tanto, poder e dinheiro. Fica, por tanto, melhor que se crie o sincretismo já citado: Já existe a água benta? Melhor que seja água ungida; Fazer óleo de ervas para dor? Não, basta o óleo de cozinha em cima do rádio e suas pregações através das ondas moduladas e frequências moduladas, ou mesmo no altar durante o culto, pois teremos o óleo ungido; Problemas de saúde e espirituais em geral? Esqueça as águas termais, beba a água do banho de seu líder espiritual[3].
Especificamente em nosso país, ainda vivemos no complexo da pobreza e das crendices. E estas pessoas, se não mais são a maioria, ainda indicam o grosso do comportamento social que possuímos atualmente. Séculos de subjulgo e detratação religiosa moldaram à barro a formação das percepção do povo. E, muito naturalmente, fomos nos distanciando disto e nos propondo a assimilações distintas do que sempre se prostrou. Mas ainda é grande o contingente de pessoas que estão arraigadas naquilo ou mesmo possuem dificuldades para se desligar completamente, seja esta uma ligação pessoas, social ou ambas.
Educação é e sempre será a chave para desfazer esta situação. Não apenas o investimento maciço (que também não ocorre), mas a estruturação predial, educacional, pedagógica e funcional do corpo de educadores. As proposições pedagógicas inseridas em todos os tratados de educação no Brasil, seus pormenores indicam uma boa base educacional[4] e abrangente o suficiente para que comecemos uma real formação de cidadãos coerentes. Mas, individualmente, muitos professores ainda utilizam de seus próprios prognósticos proselitista como base para o ensino – às vezes até mais que sua própria formação – o que acaba por desmistificar algo para mistificar outro, mesmo que o intento não seja este, já que reforça no educando o senso de que “pode haver algo fora do alcance das ciências naturais e do que o homem conhece”. Ora, mas o intento das ciências naturais não é exatamente o de se descobrir se esta de fato há? E não seria maravilhoso, portanto, o próprio aluno descobrir o que há – ou não há – neste aspecto, sem ser empurrado a apenas continuar crendo?
Erros intrínsecos nestes aspectos podem minar todo um trabalho na educação da criança, que muitas vezes não possui o respaldo da família e sociedade para desenvolver qualquer tipo de pensamento lógico e cético. Pensemos, pois, que o futuro dependerá quase que exclusivamente disto.

Dedicado à grande amiga Jacqueline K.

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